Tirar o siso pode ser uma experiência dolorosa, e realmente é, como muitos momentos em nossas vidas
O siso nada mais é que algo que atrapalha os demais dentes. Coitadinho, nasceu para incomodar. Há quem tenha os seus, mas geralmente são pessoas esperando pelo dia da extração. Apesar disso, o siso é tido como um status, um “você cresceu”, acompanhado das piadinhas de “criou juízo”, justamente por aparecer no início da vida adulta. Aliás, por que algo que incomoda e, segundo dentistas, “não serve para nada”, é símbolo de juízo?
O que acontece é que a arcada dentária humana acostumou-se com alimentos pastosos e de fácil mastigação, ocasionando uma redução no seu crescimento. Com isso, os terceiros molares, dentes saudáveis e até então úteis, começaram a incomodar. Não havia espaço para eles, e passaram a crescer uns por cima dos outros, empurrando os colegas e pedindo para sair.
Às vezes as coisas são assim na nossa vida. Algo nos incomoda, algo não consegue encontrar espaço no nosso dia a dia. É preciso arrancar pela raiz. Por mais que doa (parece que tiraram uma árvore da sua mandíbula/maxila), é necessário. Depois desse momento e de muito sangue, marca da ferida, temos os pontos. Os pontos são como amigos, que unem dois cantos cortados e contribuem com a recuperação. Quantos amigos já não serviram de ponte nessa nossa vidinha?
Outra lição pode ser tirada da anestesia. Quando vi a seringa com anestesia, já fiquei meio ressabiada. Que medo. E o líquido amorteceu tudo na minha boca. Muitas coisas mascaram nossos problemas. Às vezes você não sente nada, não quer sentir, nem pensar a respeito, mas há algo que está cortando, ferindo, enquanto tudo parece estar de acordo. A anestesia, no caso do siso, vem para bem. Mas no caso da vida não. Há quanto tempo o povo brasileiro, por exemplo, andava anestesiado – e grande parte ainda está? Quando o efeito da anestesia passa, resta dor latejante. Mas pelo menos a dor é transparente, é sincera, e não esconde nada de você: estás realmente machucado.
E depois? Depois da dor e do desconforto, e do gosto de sangue interminável, vem o sorvete. Ah, o sorvete. O dentista lhe prescreve: fique quieto, em casa, à base de sorvete. Só sorvete, iogurte, coisinhas assim. É como se o nutricionista mandasse comer batata frita todo o dia, com chocolate de sobremesa. Ou seja, depois de situações difíceis, sempre há algo de bom. Depois de se livrar do problema que nasce torto, que incomoda e traz dor, de anestesiar para esconder a ferida, depois da árvore que arrancaram do seu osso, tudo acaba bem.
Há um provérbio chinês que diz: dor antes, prazer depois. E é bem assim. É preciso lutar antes, buscar seus objetivos, encarar as dificuldades. E depois, quem sabe, tenhas sorvete lhe esperando.
Há um provérbio chinês que diz: dor antes, prazer depois. E é bem assim. É preciso lutar antes, buscar seus objetivos, encarar as dificuldades. E depois, quem sabe, tenhas sorvete lhe esperando.