segunda-feira, 8 de julho de 2013

Equívocos na Língua

Engraçado o modo como as pessoas costumam trocar palavras de grafias semelhantes, mas com significados totalmente adversos, na construção das suas frases. Seria puramente cômico se não escondesse o grande problema presente em muitos até mesmo do nível superior: a inabilidade de articulação e de expressão através da língua portuguesa, decorrente principalmente da falta de leitura e de prática.

Certa vez, ao perguntar à minha catequizanda se ela gostaria de ler um trecho da Bíblia em voz alta, recebi um: “Não, catequista, eu sou muito vergonhosa” como resposta. É óbvio que uma criança de nove anos não teria cometido crime tão hediondo a ponto de não se considerar digna de ler o Livro Sagrado em alto e bom som. Entendi que, na verdade, ela quis dizer “envergonhada”, mas confundiu-se com as palavras parecidas.

Para uma criança, ainda há muito estudo pela frente. Terá tempo para reconhecer as estruturas da língua a aumentar o vocabulário. Mas, não conseguirá fazê-lo sem o velho hábito que acompanha os cérebros mais afiados: a leitura. O professor e membro da Mensa – sociedade formada por pessoas de alto QI – Pierluigi Piazzi, bem expressa essa relação, afirmando que quem não lê não sabe escrever e nem se comunicar corretamente: é como um surdo-mudo, que apenas é mudo por não poder ouvir.

Mais do que isso, importa fazer os jovens estudantes gostarem de ler. As leituras obrigatórias a que estão submetidos os que cursam o Ensino Médio podem ocasionar um desastre nessa área. Como cobrar de um aluno despreparado a compreensão de alguns títulos clássicos? Eles acabam rotulando-os como maçantes e cansativos, injustamente. O recurso de leituras obrigatórias deve ser usado com cautela para que tenham eficiência. O aluno, quando chegar ao Ensino Médio, já deve ter acendido em si o gosto pela leitura, despertado quando encontrou um livro com o qual se identificou ainda na infância. 

Um artigo muito interessante do economista Claudio de Moura Castro analisa o perfil de leitura do brasileiro a partir de uma dificuldade por ele sentida: queria comprar estantes para livros, mas não encontrava modelos compatíveis à venda. Estantes para televisão? Aos montes. Para livros, somente aquelas montadas com ferros, estilo as de bibliotecas, consideradas “horrendas”. Pesquisando em sites estadunidenses, encontrou mais de 300 modelos de estantes com o fim de guardar os preciosos. A lógica é que ninguém vende produtos que não tenham consumidores: a média dos brasileiros é de 1,8 livro lido por habitante/ano. Pouco, comparando com os colombianos (2,4), os estadunidenses (5) e os franceses (7). Assim não dá para encher a estante. 

Os enganos frequentes eram mais percebidos na escrita. Mas, por difusão, invadem a fala, até a que deveria ser mais formal… Quem nunca parou para ouvir uma conversa alheia dentro do ônibus, quem sabe até opinando a respeito do problema de alguém totalmente desconhecido? Pois é. Foi numa dessas ocasiões que ouvi uma senhora que falava ao telefone. Ela certamente havia sido contatada para dar referências a respeito de um moço. Disse ela: “Sim, podes contratá-lo! Ele é um rapaz ótimo: trabalhador e muito interesseiro”. Bom, eu não contrataria alguém muito interesseiro para minha empresa. Uma pessoa bastante interessada seria mais motivador…




Os equívocos estão por toda a parte, e criam uma aura de que o português é uma língua complicada. Talvez fosse mais simples se bem exercitada, se reconhecida como promotora da cultura e identidade do povo, como meio principal da nossa comunicação. Assim, Olavo Bilac não se reviraria no caixão, e podemos saudosamente repetir: 

“Amo-te ó rude e doloroso idioma, 

Em que da voz materna ouvi: “Meu filho!”,

E em que Camões chorou, no exílio amargo, 

O gênio sem ventura e o amor sem brilho!”. 







3 comentários:

  1. Muito bom o teu texto Luciane Modena. Gostei muito. Parabéns, colega!!!

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  2. Muito obrigada, Peralta! Estou começando a postar textos no blog e comentários como o seu são um estímulo. Abraços!

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